por Victor Rossetti
Há muito tempo se discute como informação surge dentro do genoma dos organismos. De fato, não é algo desconhecido pela ciência. Com o estabelecimento do código genético baseado em uma trinca, que é uma forma relativamente estável de se manter a informação de como criar um organismo, compreender como ele sofre variações é fundamental para compreender como a vida muda ao longo do tempo. (veja mais em PARADIGMAS SOBRE A ORIGEM DO CÓDIGO GENÉTICO E SUAS IMPLICAÇÕES NA ÁRVORE DA VIDA). Esse é o real significado da evolução, transformação, mudança. Apesar de estável a tal ponto de garantir que as informações pulem para a geração seguinte, eventualmente variações no genoma podem ocorrer, e a trinca do código garante que essa informação seja mantida ou modificada. Assim, é a variação no genoma que mostra informação contida no ser vivo e ela pode ainda ser modifica dependendo de elementos intrínsecos ou extrínsecos que determinam como os genes serão expressos. Pesquisadores defendem que boa parte da evolução ao nível genético envolve este tipo de dinâmica. Inclusive com perdas e ganhos de genes.
Perda e ganho de genes são mecanismos importantes na consolidação ou não de uma informação de um ser vivo. Genes podem se perder em processos evolutivos ou ser duplicados, e esta dinâmica abre uma grande brecha a diversificação molecular crescente e especialização funcional. Por exemplo, certas redes genéticas são formadas por supergenes, ou ‘clusters de gene” que foram formados por processos de duplicação. Um caso clássico é o de genes homeóticos, aqueles responsáveis pela conformação estrutural do eixo anatômico e de apêndices em vertebrados. Variações no número desses genes ou nos genes propriamente dito definem o número de vértebras de animais. Por exemplo, fazendo com que vértebras de girafas sejam grandes e cumpridas o suficiente para suportar o tamanho do animal ou que as cervicas de uma coruja sejam o dobro do numero a de seres humanos.
Novos estudos agora estão apontando para uma grande quantidade de variação no número de cópias de genes e pseudogenes. Muitos deles na nossa espécie, demonstrando o quanto é frequente a ocorrência de duplicação gênica.
Quando um gene é duplicado, ele pode sofrer mutações que o tornam não funcional criando um códon de parada precoce. Neste caso o resultado é uma proteína incompleta e não funcional. Pode ocorrer também uma mutação na região promotora do gene e converte-lo em um pseudogene que acumulará mutações de forma muito mais acentuada e ficará a mercê da deriva genética, podendo ser reavivado em casos específicos de mutação. Por último, em certos casos, pode adquirir funções novas e garantir uma adaptação diante de uma exigência ambiental, eventualmente separando a espécie em dois caminhos evolutivos distintos.
Genes podem surgir a partir de regiões não codificantes. Isso ocorre quando uma seqüência reguladora é duplicada e inserida em um segmento de DNA que codifica uma proteína inédita. O exemplo mais famoso de aquisição de uma nova enzima por mutações envolvendo alterações de uma sequência é o da nylonase, uma enzima capaz de metabolizar monômeros de nylon. O Nylon é um polímero sintético. Na década de 70 algumas indústrias japonesas responsáveis por sua fabricação jogavam os restos da reação da produção de nylon em grandes tanques. Então começaram a perceber que onde esses monômeros misturados á água estavam, havia crescido bactéria. As bactérias haviam de alguma forma sintetizado uma nova enzima capaz de quebrar componentes do nylon em moléculas menores que pudessem ser utilizadas como alimento. A enzima foi então chamada de nylonase. Na década de 90 pesquisadores em laboratório submeteram bactérias de a um meio de cultura rico em monômero de nylon e observaram que as colônias de flavobacterium tinham a capacidade de se desenvolver nesse meio.
Criacionistas alegam que o esquema é um processo de degeneração gênica e portanto degeneração não é evolução e sim um efeito negativo a biologia, mesmo que ofereça benefícios á bactéria. Apesar de ser uma microevolução, mostra que informação pode ser gerada. Se uma microevolução é uma nova informação estabelecida no genoma de um ser vivo o que impede que nova informação não seja criada no âmbito da macromutação?
De fato, a melhor pergunta a ser feita aos que não aceitam a macroevolução é; como provar que as mutações que ocorrem em um determinado animal somente garante a microevolução? Porque não a macroevolução?
Até hoje nenhum artigo científico provou que as variações se restringem somente ao nível da espécie, ou que nunca poderiam extrapolar tal limite.
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Bacteria nylon gene duplicado com uma base nitrogenada “T” mutada. |
Não há qualquer perda no caso das bactérias do nylon. De fato, o caso da bactéria que metaboliza o nylon somente o faz por um processo de duplicação de gene. Não há correspondência alguma com degeneração gênomica, sendo essa uma informação inventada. Um dos artigos que trata do caso da bactéria faz menção ao mecanismo genético envolvido em tal processo e o trata como uma adaptação, ou microevolução. Isso porque a copia extra do gene tem apenas uma variação em relação á versão original, uma substituição de um par de base (uma Timina). De acordo com o auto do artigo;
Detailed examination of the DNA sequences of the original bacterium and of the nylon-ingesting version show identical versions in the gene for a key metabolic enzyme, with only one difference in over 400 nucleotides. However, this single microevolutionary addition of a single thymine (‘T’) nucleotide caused the new bacterium’s enzyme to be composed of a completely novel sequence of amino acids, via the mechanism of frame shifting. The new enzyme is 50 times less efficient than its precursor, as would be expected for a new structure which has not had time to be polished by natural selection. However, this inefficiency would certainly not be expected in the work of an intelligent designer. The genetic mutation that produced this particular irreducibly-complex enzyme probably occurred countless times in the past, and probably was always lethal, until the environment changed, and nylon was introduced.
Apesar de ser somente uma microevolução, tais fatores fazem parte de um processo cumulativo que a longo caso pode significa a separação em duas espécies. (Veja AS MARCAS DA ESPECIAÇÃO SE SOBREPONDO AO CONCEITO SUBJETIVO DE MACRO-EVOLUÇAO E ESPÉCIE)
Entretanto, na natureza há diversos exemplos de maquinarias gênicas compartilhadas entre indivíduos que proporcionam características distintas a partir do momento que seguem caminhos evolutivos diferentes.
Vejamos como essas pequenas mudanças cumulativas podem se comportar na prática. Casos como este ocorrem em borboletas do gênero Papilio e especialmente a Heliconius que ficou famosa pelos estudos de Sean B. Carroll. O estudo mostra que apenas um único lócus de supergene (ou cluster) chamado de “P” controla a diferença nas asas e na sua forma, a cor do corpo e possivelmente o comportamento.
Esses recursos são exclusivos a determinadas espécies com fronteiras nítidas e sem sobreposição de caracteres. De fato, estudou-se, se eles são inter-relacionados, hereditários, ou se é uma associação entre os elementos que podem ser adquiridos gradualmente?
Pesquisadores se uniram para enfrentar este desafio e publicaram seus resultados na revista Nature. Eles estudaram especificamente a borboleta amazônica Heliconius numata que pode misturar-se a outras borboletas. Em populações de H. numata parece coexistir cerca de sete morfologias simpátricas e cada um é uma perfeita imitação de um tipo específico de forma e cor das asas de borboletas chamadas Melinaea. Estas borboletas são apenas coloridas, mas impalatáveis as aves.
Cada característica morfológica é controlada por um alelo do lócus “P”. A situação é definida assim que os indivíduos não miméticos criados por uma combinação das morfologias de miméticos são menores que 0,7%. Isso significa que a região “P” do lócus em outras espécies do mesmo gênero esta distantemente relacionada a ordem dos genes no lócus que foi modificada. Isso é o contrário do que é observado nas regiões circundantes, porque não há mistura de cores. Se estão relacionadas é porque compartilham o mesmo lócus embora com modificações.
Então faz rearranjos evolutivos, sendo assim, na natureza pode ser visto pelo menos três rearranjos que estão em estreita relação com os fenótipos que são observadas nas asas. Assim, cada cor, forma e desenho da asa corresponde a uma organização precisa de alelos ao longo do lócus “P” através da combinação de variantes (haplótipos). Dentro de cada bloco coadaptado em que a combinação de genes produz um aspecto particular não é observada nenhuma mistura, enquanto que entre os blocos sim. A evolução fez com que permanecessem apenas certas variações e combinações, não todas. É assim que surgem combinações de formas e cores que permitem camuflagem e a evolução trabalhar no nível genético contrariando criacionistas como Eberlim que diz que a evolução e inconcebível do ponto de vista genético e da informação contida no DNA.
Heliconius tem um esquema decorativo das asas muito semelhantes. Ao mesmo tempo, estes padrões de cores mudam dentro da espécie dependendo da área geográfica. O caso mais impressionante é o da presença de cerca de 30 subespécies de Heliconius melpomene que imitam as cores e formas da Heliconius erato que também tem várias subespécies. Estas duas espécies se assemelham em um de seus membros no Brasil, Equador e Peru, mas não quando se comparam borboletas de diferentes países. Isso quer dizer que cada país tem um contingente próprio de raças para cada uma dessas duas espécies. As H. melpomene no Brasil tem suas subespécies enquanto as do Equador tem as suas e o mesmo com as do Peru. Evolutivamente, já se sabe que o mecanismo genético responsável pelo padrão de coloração de todas as Heliconius é o mesmo (ver o último link to texto). De fato, até mesmo cada subespécie de H. melpomene tem suas variações. Eis um exemplo abaixo de uma subespécie de H. melpomene e suas variações geográficas e veja todas as variações geográficas clicando aqui.
Algumas Heliconius melpomene do Peru
Essas borboletas do gênero Heliconius têm um sabor desagradável para os predadores. As borboletas são adaptadas de modo que a pressão seletiva dos predadores em uma determinada região procure imitar as cores das espécies não digeríveis. Quanto mais evidente sua cor impalatável melhor para elas. A espécie de compartilhar o custo da educação dos predadores a seus padrões de coloração umas com as outras, tornando gastos evolutivamente mais sustentáveis.
Sabendo que a mudança nas cores e forma das asas das borboletas é determinada por alguns genes, o que torna o caso interessante é que as diferentes cores não são um caso de evolução convergente. Pelo contrário, é um verdadeiro intercâmbio de material genético que ocorre entre espécies diferentes. Um evento evolutivo raro de grandes proporções até agora desconhecido em outros animais.
Nestes casos, acontece que duas espécies cruzam e seus descendentes, embora híbridos, mostram-se férteis e selecionadas positivamente graças ao benefício conferido pela coloração das asas. Isso termina por desestimular os predadores, educando-os de acordo com o padrão e coloração. Então Heliconius melpomene e erato trocam genes que permitem a formação de híbridos saudáveis e com padrão de coloração próximo.
É um método muito mais rápido a evoluir em vez de esperar que o resultado provenha de evolução convergente. Pesquisadores também notaram que a estrutura do genoma dos lepidopteros permaneceu praticamente inalterada durante mais de 100 milhões de anos, quandoHeliconius se diferenciou da sua ancestral mais próxima, a lagarta Bombyx mori, durante o Cretáceo. Isso ocorreu quando houve a transição da vida noturna para a diurna. Sem dúvida houve uma melhora na acuidade visual. Heliconius tem de fato uma concentração de opsina maior. Essas proteínas que compõem os fotorreceptores capturam a luz na retina. Assim, em comparação com a Bombyx mori as borboletas são capazes de detectar o ultravioleta para além dos comprimentos de onda grandes e ao azul. De fato, o azul atrai muitas borboletas, especialmente as do gênero Morpho.
Saiba mais em BIOLOGIA, ECOLOGIA, EVOLUÇÃO E GENÉTICA DE POPULAÇÕES DE BORBOLETAS HELICONIUS DO BRASIL.
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REFERÊNCIAS
* UN SUPERGENE PER TAVOLOZZA. PIKAIA – IL PORTALE DELL’EVOLUZIONEUN SUPERGENE PER TAVOLOZZA.
* LE FARFALLE NE FANNO DI TUTTI I COLORI. PIKAIA – IL PORTALE DELL’EVOLUZIONEUN SUPERGENE PER TAVOLOZZA.
* DAVID THOMAS. EVOLUTION AND INFORMATION:THE NYLON BUG. NEW MEXICANS FOR SCIENCE AND REASON PRESENTS. NOVEMBER 5, 2004.
* RODRIGO VÉRAS. A ORIGEM DE NOVA INFORMAÇÃO GENÉTICA. PARTE I. EVOLUCIONISMO. 11 JUNHO 2010
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